sexta-feira, 11 de março de 2011

No comboio descendente (2)



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O autor:
Foto de ANAAS




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No comboio descendente,
vinha toda a gente em pé,
uns pra dar lugar a um velho,
outros à mãe e ao bebé.
No comboio descendente
de Portimão a Loulé.

No comboio descendente,
vinham todos com ar raro,
uns a dizer: — É barato!
e os outros que era caro.
No comboio descendente
desde Loulé até Faro.

No comboio descendente,
lá voltou a reinação:
uns a tocar concertina,
outros tocando violão.
No comboio descendente
desde Faro até Olhão.

No comboio descendente,
ia muita gente gira,
uns dançando o corridinho,
outros a dançar o vira.
No comboio descendente
desde Olhão até Tavira.

No comboio descendente,
nunca se viu coisa assim:
uns a falar Português,
outros Grego, outros Latim.
No comboio descendente
Tavira - Castro Marim.

O comboio descendente
não chegou ao fim da linha.
Descarrilou, de repente,
por causa de uma galinha.
Por um triz, matava a gente
toda, toda que lá vinha.

Era o desastre total!...
Mas o maquinista, idóneo,
meteu pela Nacional.
No meio de um pandemónio,
foi ter a Vila Real,
por graça de Santo António.

Anthero Monteiro,
A Sara Sardapintada, Porto, Corpos Editora, 2004