quinta-feira, 21 de abril de 2011

Cântico azul e branco


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«Vem para aqui» - dizem-me alguns com olhos de carneiro mal morto,
estendendo-me os braços, e seguros
de que seria bom que eu os ouvisse
quando me dizem p’ra sair do Porto.
Eu olho-os com olhos de desprezo
(há, nos meus olhos, um carvão aceso)
e fico ao chão bem preso,
e nunca vou para ali…

A minha glória é esta:
ficar a olhar a azul imensidade!
Não ir atrás de ninguém!
- Que eu amo o azul até à eternidade
desde o dia em rasguei o ventre a minha mãe.

Não, não vou para aí! Só vou p’ra onde
haja azul , muito azul com listas brancas
e se assim com firmeza meu gesto vos responde,
porque me repetis: «vem para aqui»?
Prefiro à Luz a Rua Escura e à Madragoa
o meu Bolhão e à Mouraria de Lisboa
eu prefiro, carago, andar por aí à toa
a ir para aí…

Se vim ao mundo, foi
só p’ra gritar Porto! Porto! até ao infinito,
e voltar a soltar o meu grito
de boca escancarada!…
Tudo o mais que disser não vale nada.

Como, pois, sereis vós
que me fareis promessas, convites e
ameaças,
para me ver mudar as minhas convicções?...
Corre, nas vossas veias, só o sangue mourisco
e vós amais o que não presta!
Eu amo o Azul e Branco,
o Risco,
a Festa,
e o fogo que sai da goela dos Dragões…

Ide! tendes águias já com gripe,
tendes árbitros fidelíssimos,
nunca tendes sumaríssimos
e tendes penálties, Calabotes e largos prolongamentos.
- Eu tenho a minha bandeira azul!
Ergo-a bem alto
e desafio o Sul
e, todo ufano, canto vitória
aos quatro ventos…

O azul e o branco é que me guiam, mais
ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
mas eu, que ganho sempre a minha aposta,
nasci do amor que há entre a vitória
e o Pinto da Costa.

Ah, que ninguém me venha com tão más intenções!
Eu sou apenas dos Dragões!
Ninguém me diga: «Vem para aqui»!
A minha vida é o Porto onde feliz eu sou,
A minha vida é o Porto onde a glória ancorou,
A minha vida é o Porto onde a festa estoirou!
Eu sei bem onde estou,
eu sei bem p’ra onde vou,
sei que não vou para aí!


Anthero Monteiro(inédito)

Uma paródia do «Cântico Negro» de José Régio:
comparar nesta Praça, aqui:

http://pracadapoesia.blogspot.com/2008/12/cntico-negro.html