sábado, 19 de novembro de 2011

No teu quarto




















com mais ninguém em casa entro nos teus domínios
e levas-me a um lugar de sonho e do teu sono
impera no teu quarto a cama como um trono
e há segredos aos mil em gavetas de escrínios

o sol e outros olhares penetram indiscretos
sorrio com malícia ao correres a cortina
mas vejo na parede a foto da menina
que tiraste uma vez com seis anos completos

e esse olhar virginal que afasta os próprios lobos
retém a minha mão como se houvera um pacto
por isso é que ficou teu leito assim intacto
porque eu manietei todos os meus arroubos

e sentei-me no chão à falta de melhor
encostaste-te a mim suave doce esguia
e ficámos a ouvir a eterna melodia
de um prelúdio de bach em mi bemol maior

estava atrás de ti sem nada de permeio
e um raio de sol curioso quase a pique
viu na minha mão esquerda um poema de rilke
e achou-me a outra mão a soletrar-te o seio.

Anthero Monteiro, Sete Vezes Sete Nuvens,
Porto, Egoiste, 2010