quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Ao albatroz



















Tu, que dormiste toda a noite sobre a tempestade,
que acordas e descansas sobre as tuas asas prodigiosas,
(desencadeou-se a tempestade brutal? acima dela ergues-te e repousas no céu, esse escravo que te abriga).
Agora pareces um ponto azul, ao longe pairando no céu,
e com a luz que surge observo-te do convés,
(eu próprio sou apenas um ponto, um sinal sobre a flutuante vastidão do mundo).

Longe, longe no mar,
depois de as bravias e nocturnas correntes terem semeado a praia de despojos,
ao romper do dia, feliz e sereno,
com a alvorada rosa e elástica, com o sol deslumbrante,
com a límpida extensão do ar cerúleo,
tu também reapareces.

Tu, nascido para medir a tempestade (és todo asas),
para competir com o céu e a terra, com os mares e os furacões,
tu, navio do ar que nunca arriaste velas,
durante dias e semanas percorreste, infatigável, espaços e reinos, avançando sempre,
e ao crepúsculo olhaste o Senegal e a enlutada América,
que irrompia entre relâmpagos e nuvens de trovoada,
e aí nas tuas experiências, encontraste a minha alma,
quantas alegrias! quantas alegrias as tuas!

Walt Whitman (trad. de José Agostinho Baptista), in Jorge de Sousa Braga (organização), Animal Animal co, Lisboa, Assírio & Alvim, 2005
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ANIMAL ANIMAL - um bestiário poético é uma coletânea preciosa sobre o tema a que, neste blogue temático, damos a designação de ZOO. Desse livro, organizado pelo amigo poeta Jorge de Sousa Braga, retirámos apenas este texto de W. Whitman, mas aqui deixamos a recomendação da respetiva consulta para um eventual tratamento desse tema. Contém mais de uma centena de poemas de autores portugueses, desde O'Neill a Fernando Assis Pacheco, e internacionais, de Alfonsina Storni a William Carlos Williams, de Lautréamont a Rainer Maria Rilke.
O poema de Whitman serve perfeitamente também o tema NAVEGAR.