quarta-feira, 19 de junho de 2013
benilde
foi benilde
o seu primeiro grande amor
conheceu-a
na festa de agosto
passeou
com ela de mãos dadas o olhar obcecado
pela
luz que irradiava aquele rosto
mais
grácil e doce do que o da santa do andor
fascinava-o
mais do que todas as ruas ornamentadas
de
chão fragrante das hidrângeas pisadas da procissão
seduzia-o
mais que o carrossel e a pista de carros
e refulgia
mais que o templo engastado
de
mil lâmpadas a realçar-lhe os contornos
viera
de longe com os pais andaram juntos
toda
aquela tarde de verão para ele um braseiro
sobretudo
de deslumbramento até que ela se despediu
até
quando com um beijo inocente à hora em que o sol
disse
também adeus àquele dia rememorável
prometeu
que só adormeceria quando a imagem dela
se
desenhasse nos seus olhos íntimos ela
veio
esplendorosa
e sem estorvo revisitá-lo para fechar-lhe
os
outros olhos e inaugurar um sonho
diferente
tentou
manter bem acordados aquele lume e a febre
daquelas noites em que buscava e rebuscava
reencontrá-la
nos labirintos interiores e trazê-la
bem
nítida à tona clara da consciência
ao
fim de uma semana perdia-se nessa babilónia
ela
escapava-se-lhe jogava às escondidas
escorregava
como um peixe que se apanha
recupera
a água e regressa ao esconderijo do lodo
as
horas escorriam dolorosas negavam-lhe
o
ansiado rosto apenas entrevia efémeros retalhos
lampejos
que eram esgares e mais escárnio
que
assentimento mais zombaria que esperança
o
assombro imbricou na tortura depois na resignação
e
enfim o olvido repôs o equilíbrio
inicial
aquele
estúpido bem-estar de quem já nada anseia
tinham
ambos dez anos e ele pediu em casa
que
o deixassem ir estudar para padre
já
tinha aberto assim o inventário penitencial
com
aquela grande e pungente renúncia
Anthero Monteiro