terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Olvido




















a olívio puseram-lhe a alcunha de olvido
toda a sua vida era esquecimento

esquecia-se de fazer a barba e de se pentear
esquecia-se de abotoar a carcela
esquecia-se de tomar o centrum
esquecia-se de fechar a porta quando saía
esquecia-se das chaves dentro do carro
esquecia-se do local onde o estacionava
esquecia-se de o levar à revisão
esquecia-se de meter combustível
esquecia-se do código do cartão de crédito
esquecia-se de pagar o café
esquecia-se de dar os parabéns aos amigos aniversariantes
esquecia-se do próprio aniversário
esquecia-se de voltar para casa
esquecia-se de deixar comida para o seu black
esquecia-se do que ia dizer

com tanto que se esquecia
era também esquecido de todos
e quando morreu abandonado
o seu ataúde de papelão
foi acompanhado ao cemitério
por dois vagabundos uma puta e um imigrante
para além do seu lazarento rafeiro

a pobre tumba não exibe nem o seu nome
nem as datas de nascimento e óbito
não ostenta sequer uma simples cruz
ou outro qualquer símbolo
que lhe augure um eterno descanso

às vezes perpassam por ali em viagem
uma lesma uma lagartixa ou um licranço
mas as borboletas não se detêm
porque nunca viram naquele canteiro
uma única flor

e olvido ali ficou encerrado
entre quatro paredes de esque
cimento

Anthero Monteiro