segunda-feira, 29 de março de 2010

Hino ao Porto




Um domingo
junto aos Clérigos


Foto A.M.






Cidade em que as burguesas vão à missa
Vestidas de vermelho carmesim.
Em vão, a luz, sobre elas, se espreguiça...
(As mães, pelo caminho, ao vir da missa
Proíbem-lhes os bancos do jardim...)

Não há fidalgos hoje. Há comerciantes.
É deles todo o ar que se respira!
Noites sem flor, sem luz, sem estudantes
E sem guitarras e sem mentira!

Para sentir o mar, o rio eterno
Cava, connosco, a rocha que dormia
E deita-se connosco, na alegria
De imaginar o céu, calcando o inferno.

Na rua escura as lojas de oiro e pano
São pedras frias, frígidas mas quietas.
Ó frios mercadores de oiro e pano
Porto! Mercado frio e desumano...
E no entanto ali é que há Poetas!

Lutar! — é o verbo. — Não morrer — é a vida.
Mas em surgindo a morte, que na estrada
Os ombros verguem sob a urna pesada
E seja lenta a hora da partida!

Noites sem luz, sem mel, sem fantasia!
Noites sem estudantes e sem flor!
Porto! — cidade pulmonar e fria
Que tens a força de negar ao dia
A medicina do amor!

Pedro Homem de Mello, Bodas Vermelhas