segunda-feira, 29 de março de 2010

A minha cidade












A minha cidade não se chama Lisboa,
não tem cheiro a sul
e nem por ela passa o Tejo,
mas como ela, tem Nascentes
leitosos e marmóreos...
Na minha cidade os Poentes são de ouro
sobre o Douro e o mar
e só ela tem a luz do entardecer
a enfeitar o granito...
Na minha cidade, tal como em Lisboa
há gaivotas e maresia
mas não há cacilheiros no rio
há rabelos
transportando nectar e almas...
Da minha cidade nasce o Norte
alcantilado, insubmisso
e o sol, quando chega, penetra-a
delicadamente, carinhosamente,
depois de vencido o nevoeiro...
Na minha cidade também há pregões,
gatos, pombas, castanhas assadas e iscas
e fado pelas vielas, pendurado com molas,
como roupa a secar nos arames...
A minha cidade tem também tardes languescentes,
coretos nas praças
velhos jogando cartas em mesas de jardim
e o revivalismo de viúvas e solteironas
passeando de eléctrico...
É bem verdade que na minha cidade
a luz, não é como a de Lisboa
mas a luz da minha cidade
é um frémito de amor do astro-rei
a beijá-la na fronte, cada manhã!...


Maria Mamede*

in http://mulher50a60.weblog.com.pt/arquivo/2005/01/a_minha_cidade.html

* Pseudónimo literário de Maria do Céu Silva Fernandes, nasceu em 1947 em S. Mamede de Infesta. É autora de vários livros de poesia e conto:

POESIA: Desencontro - 1977; Uma Mão Cheia de Nada - 1978; Palavras Gastas - 1994; Retratos - 2000; Pelas Letras do Alfabeto - 2001; Banalidades - 2003; Poemas Maiatos - 2004; Lume - 2006.

CONTOS: Memórias da Minha Gente - 2004; Da Água Toda - 2010.