segunda-feira, 14 de junho de 2010
Relação de casas boas e más para juízo dos arquitectos Carlos Loureiro e Pádua Ramos
Há casas
cuja beleza começa no projecto;
outras, e são talvez as mais belas,
existem só na cabeça do arquitecto.
Há casas feitas à medida do homem,
outras há para andar de bicicleta;
há casas sobre cascatas
onde ao sortilégio da água
se junta a música de Bach.
Há casas tão ajustadas
como fato por medida
ou um verso de Cesário,
outras de tão confusas
não viram régua nem esquadro.
Há casas de papel,
casas de madeira,
casas de palha e de barro;
casas que trepam pelo céu,
casas que cheiram
a jasmim do Cabo;
há casas só para dormir,
parecidas com um sudário.
Há casas onde habitar
é o começo da morte;
há casas de pátios caiados
com varandas para o mar;
casas onde apetece
estar sentado
com um gato nos joelhos
e o coração apaziguado.
Há casas com recantos para amar,
há outras onde o amor
se faz em cinco minutos,
e às vezes já é demais;
há casas como um dedal
e geometria de abelhas,
casas de perfil
atento ao rumor
de nascentes e de estrelas.
Há casas como um cristal,
casas de luz circular,
casas onde não é possível
ouvir correr o silêncio,
há casas que de casas só têm o nome;
há casas que nem para cães.
Há casas tão inteligentes
que não consentem qualquer margem
para luxos e arrebiques,
casas onde a alegria se instala
sem tempo nenhum para a mágoa.
Há casas onde o pão é triste
e a roupa mal lavada;
há casas que são um rio; há casas
que são um barco,
outras têm pomares
onde os dióspiros ardem;
há casas com terras de vinho e trigo
e muros a toda a roda.
Há casas que são um poema
para dar a um amigo.
Eugénio de Andrade, Poesia,
Porto, Fundação Eugénio de Andrade, 2000
cuja beleza começa no projecto;
outras, e são talvez as mais belas,
existem só na cabeça do arquitecto.
Há casas feitas à medida do homem,
outras há para andar de bicicleta;
há casas sobre cascatas
onde ao sortilégio da água
se junta a música de Bach.
Há casas tão ajustadas
como fato por medida
ou um verso de Cesário,
outras de tão confusas
não viram régua nem esquadro.
Há casas de papel,
casas de madeira,
casas de palha e de barro;
casas que trepam pelo céu,
casas que cheiram
a jasmim do Cabo;
há casas só para dormir,
parecidas com um sudário.
Há casas onde habitar
é o começo da morte;
há casas de pátios caiados
com varandas para o mar;
casas onde apetece
estar sentado
com um gato nos joelhos
e o coração apaziguado.
Há casas com recantos para amar,
há outras onde o amor
se faz em cinco minutos,
e às vezes já é demais;
há casas como um dedal
e geometria de abelhas,
casas de perfil
atento ao rumor
de nascentes e de estrelas.
Há casas como um cristal,
casas de luz circular,
casas onde não é possível
ouvir correr o silêncio,
há casas que de casas só têm o nome;
há casas que nem para cães.
Há casas tão inteligentes
que não consentem qualquer margem
para luxos e arrebiques,
casas onde a alegria se instala
sem tempo nenhum para a mágoa.
Há casas onde o pão é triste
e a roupa mal lavada;
há casas que são um rio; há casas
que são um barco,
outras têm pomares
onde os dióspiros ardem;
há casas com terras de vinho e trigo
e muros a toda a roda.
Há casas que são um poema
para dar a um amigo.
Eugénio de Andrade, Poesia,
Porto, Fundação Eugénio de Andrade, 2000
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ARQUITECTURA e POESIA,
AS CASAS,
Eugénio de Andrade