quinta-feira, 30 de abril de 2009
Entre as rosas
Salvador Dali,
Meditative Rose, 1958
in www.theartistsalvadordali.com
Desenho a minha ausência
juntamente com as rosas que murcham
mesmo em frente à janela onde escrevo.
Deixei cair umas pétalas, o ténue fio
de um caminho que se perde antes
do horizonte. Conto as letras que encontrei
nos bolsos, não chegam para nada
e não há perguntas, nada que queira saber.
Uns trocos para pão, migalhas no caminho
onde me esperas como se eu fosse um pássaro
faminto. Dou-te uma bicada de amor:
é tudo o que ficou fora do desenho.
As árvores dão estalidos
como se o vento se tivesse levantado
tão cedo. Estou aqui de véspera
e nem sequer estou cansada.
Atrás do monte há um roseiral.
Quando lá chegar direi que estive à tua espera
e será verdade como tudo o que escrevo:
amar-te-ei sempre entre as rosas
que planto ao acaso no papel
onde um rio canta
porque me esqueci de desenhar as margens.
Rosa Alice Branco, Soletrar o Dia,
V. N. Famalicão, Edições Quasi, 2002, 1.ª ed.