quarta-feira, 6 de maio de 2009

3 horas, 16 minutos e 30 segundos











Bukowski in






supõe-se que sou um grande poeta
e tenho sono pela tarde
sei que a morte é um touro gigantesco
disposto a investir contra mim
e tenho sono pela tarde
sei que há guerras e homens que lutam no ringue
sei que há boa comida, bons vinhos, boas mulheres
e tenho sono pela tarde
sei que há uma mulher que me ama
e tenho sono pela tarde,
inclino-me para o sol atrás de uma cortina amarela
e pergunto a mim mesmo para onde terão ido as moscas de verão
recordo a morte tão sangrenta de Hemingway
e tenho sono pela tarde.

virá um dia em que não tenha sono pela tarde
qualquer dia escreverei um poema que incendiará vulcões
lá fora nas colinas
mas agora mesmo tenho sono pela tarde
e alguém me pergunta Bukowsky, que horas são?
e eu respondo 3 horas, 16 minutos e 30 segundos.
sinto-me muito culpado, sinto-me asqueroso, inútil,
demente e tenho sono pela tarde
estão a bombardear igrejas, bem, isso está bem,
as crianças montam em póneis nos parques, isso está bem,
as bibliotecas estão cheias de livros sábios,
há música grandiosa encerrada dentro da rádio
e tenho sono pela tarde,
tenho uma tumba dentro de mim dizendo
bah, deixa que os outros o façam, deixa que os outros ganhem,
deixa-me dormir,

o engenho está às escuras
limpando a escuridão como uma escova,
vou até onde foram as moscas de verão,
tentem apanhar-me.


Charles Bukowski
20 Poemas, Mondadori

(tradução de Antero Monteiro)