segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

No meu desejo





















Foto A.M.



Tem dó de quem não dorme,
de quem passa a noite à espera
que desperte o silêncio.
O vento devia cantar nos plátanos
com a lua nova, ser mais uma folha
feliz nos ombros do outono.
Mas o vento parecia ter endoidecido:
de leste a oeste varria
a rua, varria a noite: o vento
alegremente
varria o mundo ― em turbilhão
arrastava o lixo mil vezes imundo.
E o sono chegava.

Eugénio de Andrade, O Sal da Língua,
Ed. Fundação Eug. Andrade, Porto, 1ª ed., 1995