quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Encontro



















Jonathan,
se resolvermos que o céu
é este lugar onde ninguém nos ouve,
quem poderá salvar-nos?
Quanto tempo resistiríamos
sem falar a ninguém deste acontecimento?
Acompanhei com os dedos
o desenho miraculoso do teu lábio,
contornei-lhe as gengivas, bati-lhe no dente escuro
como um cavalo,
um cavalo meu na campina.
Pedi-lhe: faz com tua unha um risco
na minha cara,
o amor da morte instigando-nos
com nunca vista coragem.
Vamos morrer juntos
antes que o corpo alardeie
sua mísera condição.

Agora, Jonathan
neste lugar tão ermo,
neste lugar perfeito.

Adélia Prado, A Faca no Peito, 1988

Escritora brasileira, nascida em 1935 em Divinópolis
- Minas Gerais: «Adélia é fogo, fogo de Deus em Divinópolis.» (Carlos Drummond de Andrade).