segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Dia 13 Sexta-Feira





















Acordei estremunhado
com a grande chinfrineira
do relógio avariado
na mesa de cabeceira.
Era hora já tardia,
tão tardia de maneira
que ia perder — que arrelia! —
o autocarro da carreira.
Mas que fazer, se era dia…
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Corri logo a tomar banho,
escorreguei na banheira
e fiz um enorme lanho
ao cair contra a torneira.
Enchi de sangue a toalha,
quebrei a saboneteira.
Parecia uma batalha
com toda aquela nojeira.
Não há ninguém que me valha,
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Ao pequeno almoço, o pão
queimou-se na torradeira.
Entornei leite no chão
e partiu-se a cafeteira.
Ao lutar c’um esfregão
contra uma varejeira,
bati mas foi com a mão
no vidro da cristaleira.
Para o vidro não é bom
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Mal saí, uma cadela
que rebentara a coleira
mordeu-me numa canela
com pontaria certeira.
Tropecei numa raiz
duma enorme laranjeira
e bati com o nariz
numa cobra cuspideira.
É data muito infeliz
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Fui para a escola já tonto
de tanto azar e canseira.
Para mais havia ponto
que não era brincadeira…
Mas a colega Angelina
empurrou-me da carteira,
embati contra uma esquina
e estraguei a lapiseira.
O que é… não se imagina
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Mal saí, fui jogar bola
para o larguinho da feira.
Dei logo cabo da sola
da minha pobre chuteira.
Fintei o Jorge, o Tiago,
a outra equipa toda inteira,
mas o chuto fez estrago
no vidro da costureira.
Que dia tão aziago
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Depois passei pelo prado
e caí então na asneira
de me sentar descansado
debaixo de uma oliveira.
Veio esperto um passarinho
e fez-me grande sujeira
no meu branco colarinho
e também na cabeleira.
Mas que dia tão daninho
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Foi ao voltar que dei fé
de ter perdido a carteira,
de ter perdido o boné,
de ter perdido a pulseira.
Por distracção ou por pressa,
por engano ou parvalheira,
também perdi a cabeça
e não foi a vez primeira!
Não sei que mais me aconteça
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!

Atirei-me para a cama
numa imensa choradeira:
— Ninguém me ama, ninguém me ama!
Não há ninguém que me queira!
…Mas o vizinho Rodrigo,
ao ouvir tal barulheira,
ao sentir que eu estava em perigo,
veio ter à minha beira
e ficou ali comigo
numa ternura fagueira.
Parecia um bom abrigo
para a minha vida inteira
Ganhei então um amigo
DIA TREZE SEXTA-FEIRA!


Anthero Monteiro, A Sara Sardapintada,
V. N. Gaia, Corpos Editora, 2004