quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Cacida da mulher deitada






Amedeo Modigliani,
Nu couché de dos - 1917
Oil on canvas
Barnes Foundation,
Merion, PA



O ver-te nua é recordar a Terra,
a Terra lisa, limpa de cavalos.
A Terra sem um junco, forma pura
e cerrada ao porvir: confim de prata.

O ver-te nua é compreender a ânsia
da chuva que procura um corpo frágil,
ou a febre do mar de imenso rosto
sem encontrar a luz da tua face.

O sangue soará pelas alcovas
e virá com espadas fulgurantes,
mas tu não saberás onde se ocultam
o coração de sapo ou a violeta.

Teu ventre é uma luta de raízes,
teus lábios uma aurora sem contorno.
Debaixo das rosas tépidas da cama,
à espera de vez, gemem os mortos.

Federico García Lorca, "Diván del Tamarit" in
Antologia Poética, Lisboa, Relógio d'Água, 1993,
Tradução de José Bento

Casida ou Cacida (trad. de José Bento para português) é
, segundo os poucos dicionários que registam o termo, proveniente do árabe, uma pequena composição poética de tema amoroso. De acordo com Emílio García Gómez, autor da nota introdutória ao "Diván del Tamarit", seria «um poema de certa extensão, com determinada arquitectura interna (...) e em versos com uma única rima, medidos de acordo com as normas escrupulosamente estereotipadas».
Diván
é, para o mesmo autor, «a colecção das composições de um poeta, geralmente catalogadas por ordem alfabética de rimas».
García Gómez explica ainda que, em Lorca, estas denominações não se ajustam às definições anteriores, pelo que, «neste sentido, são arbitrárias».