domingo, 21 de junho de 2009
Diário de Bordo
Foto A.M.
Letra a letra,
hora a hora,
linha a linha,
marquei no Diário de Bordo
as fases da viagem.
Dias e dias no embalar das vagas,
sem que um bafo de brisa poluísse
o abandono tentador das velas;
expedições forçadas, abordagens;
fome e sede de carne, nos jejuns
de cem dias de Mar;
velhos contos de bordo, em noites podres,
sem lua e sem estrelas;
o escorbuto na alma, apodrecida
à espera dos combates;
os rateios da presa recolhida
e, ao fim,
a Ilha dos Amores de qualquer porto
onde as mulheres se vendem.
E tudo foi, profundamente,
inútil.
Livro de Bordo de Corsário, deixa
que o tempo apague a tua prosa inútil
e escreve a história imensa
daquela frota em que tu vais partir
- como pobre navio auxiliar -
à demanda e à conquista
do Novo Continente!
Álvaro Feijó, Os Poemas de Álvaro Feijó,
Porto, Brasília Editora, 1978, 3.ª edição