segunda-feira, 15 de junho de 2009

Elogio do teu corpo na praia





Boticelli,
Afrodite






De costas para o mar.
as tuas pernas como dois lírios brancos.
duas conchas cavadas no lado de trás dos joelhos,
pequenas gotas de água evaporando-se dentro delas.
o sol começa a dar-te uma cor de ébano novo.
a luz é intensa.
estendo-me junto de ti.
pouso a cabeça nos teus quadris,
essa doce e quente enseada.
como uma sucessão de ondas
as tuas ancas estremecem,
rolam na minha boca.
tenho a minha boca colocada nas tuas ancas.
as minhas mãos nas tuas omoplatas.
respiro contidamente como se fosse uma morte.
beijo-te o pescoço em silêncio.
a luz na praia agora é mais crua.
levantas-te. desapareces na água. respiro ainda em silêncio.
quando regressas o sol é uma rosácea faiscante.
volto a colocar a minha cabeça sobre o teu corpo.
o cheiro intenso do sal abre-me as narinas.
digo muito baixo: é afrodite que vem do mar.
e fico silencioso como um barco ancorado.
da baía do teu corpo começam a levantar voo
as gaivotas das minhas mãos.

Luís Pignatelli, Obra Poética,
Lisboa, &etc, 1999