terça-feira, 30 de setembro de 2008

Aos poetas gosto de os ler...


Aos poetas gosto de os ler no sossego da noite. São apelos frágeis e sinceros. Os poetas não possuem poder nenhum. Só o de encobrirem feridas abertas com letras. Apesar de alguns deles conseguirem vibrar todos os sóis nocturnos coalescidos no íntimo mais profundo de cada um, não passam de pássaros feridos em busca de ninho seguro. O rosnar de um canhão é mais terrível. Não existe repouso possível numa ode à alegria de Goethe na boca de um faminto. E isso é perfídia. O poeta não é carrejão da estupidez humana. Não. Nem lenço para as lágrimas amargas dos impotentes. E isso é dramático. O poema mais belo não é mais que isso. Um requintado enfeite na vaidade do ego mais sensível. Nos laboratórios da "Alta criação para a estupidez total do Ser" estuda-se hoje a extinção da profissão de poeta. Provou-se estatisticamente a sua inutilidade. Um bico de obra.
Acontece que qualquer ser vivo se pode transformar num desses fogos fátuos que iluminam, mesmo que fugazmente, a penumbra mais absoluta.
Um defeito tipicamente humano.


Humberto Érre, Bastardos de Deus