segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Então queres ser escritor?

Se não sai de ti a arder
apesar de tudo o resto,
não o faças.
a menos que sem quereres saia do teu
coração e da tua mente e da tua boca
e das tuas tripas,
não o faças.
se tens de estar horas sentado
a olhar para o ecrã do computador
ou curvado sobre a
máquina de escrever
à procura de palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes porque queres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens de estar sentado a
reescrever e a reescrever,
não o faças.
Se te cansa só de pensar nisso,
não o faças.
se estás a tentar escrever
imitando alguém,
esquece.
se tens de esperar até que saia de ti
aos berros,
sê paciente.
se nunca sair de ti aos berros,
faz outra coisa qualquer.

se primeiro o tens de ler à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou aos teus pais ou seja lá a quem for,
não estás preparado.

não sejas como tantos escritores,
não sejas como tantos milhares de
pessoas que se julgam escritores,
não sejas monótono e aborrecido e
pretensioso, não te sufoques
com amor próprio.

As bibliotecas do mundo
bocejaram e adormeceram
por causa de tipos como tu.
não os sigas.
não o faças.
a menos que te saia
da alma como um míssil,
a menos que estar parado te
leve à loucura ou
ao suicídio ou ao homicídio,
não o faças.
a menos que o sol que tens dentro de ti
te esteja a queimar as entranhas,
não o faças.

quando chegar o momento,
e se tu foste escolhido,
vai acontecer
por si mesmo e assim continuará
até que morras ou ou que isso morra em ti.

não há alternativa.

e nunca houve.

Charles Bukowski
(tradução de Anthero Monteiro)