quinta-feira, 27 de novembro de 2008

O Natal

Aproximava-se a noite de Natal, naquela comunidade do Sul.

Numa azáfama incontrolável, as ruas da cidade, nessa tarde de 24 de Dezembro, estavam completamente apinhadas. Entrava-se e saía-se dos grandes armazéns, ajoujados das mais variadas prendas para distribuir nessa noite ou na manhã seguinte. Sobretudo os mais novos viviam um momento de euforia procurando que os pais lhe comprassem todos os géneros de brinquedos e guloseimas. Havia nas ruas um ar de festa ouvindo-se, a sair de todas as lojas, alegres cânticos de Natal.

A comunidade festejava, mais uma vez, o nascimento do Salvador.

Ao chegar ao lar, o casal, que passara toda a tarde nas ruas centrais da cidade, nessa loucura feita de alegria e constrangimento por, afinal, não poderem comprar tudo quanto desejariam, encontrou os avós e os sobrinhos-órfãos, sentados, aguardando o seu regresso. Por outro lado, os filhos rodearam-nos, febris, tentando adivinhar que presentes iriam receber, um pouco mais tarde, após a ceia.

Chegadas as 10 horas da noite toda a família se sentou em volta da mesa para a refeição festiva.

A mãe veio da cozinha, ajudada pelas duas avós, trazendo uma enorme bandeja que, solenemente, pôs em cima da mesa. Imediatamente toda a pequenada se lançou, com voracidade, sobre a iguaria, constituída por um robusto homem moreno, assado com batatas louras, em molho de vinho tinto da região. Os pais puseram cobro àquele assalto desordenado e dividiram, irmãmente, o homem.

A comunidade que, então, festejava o Natal, era, como já se aperceberam, uma comunidade de perus.

Orlando Neves, A Condecoração, Lisboa, Edições Rolim