segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Ó capitão! Meu capitão!

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Retrato de Abraham Lincoln
(in
www.topicsites.com)


Oh capitão! Meu capitão! terminou a nossa terrível viagem,
O navio resistiu a todas as tormentas, o prémio que buscávamos está ganho,
O porto está próximo, oiço os sinos, toda a gente está exultante,
Enquanto seguem com os olhos a firme quilha, o ameaçador e temerário navio:
Mas oh coração! coração! coração!
Oh as gotas vermelhas e sangrentas,
Onde no convés o meu capitão jaz,
Tombado, frio e morto.

Oh capitão! meu capitão! ergue-te e ouve os sinos;
Ergue-te, a bandeira agita-se por ti, o cornetim vibra por ti;
Para ti ramos de flores e grinaldas guarnecidas com fitas, para ti as multidões nas praias,
Chamam por ti, as massas agitam-se, os seus rostos ansiosos voltam-se;
Aqui capitão! querido pai!
Passo o braço por baixo da tua cabeça!
Não passa de um sonho que, no convés,
Tenhas tombado, frio e morto.

O meu capitão não responde, os seus lábios estão pálidos eimóveis,
O meu pai não sente o meu braço, não tem pulso nem vontade,
O navio ancorou são e salvo, a viagem terminou e está concluída,
O navio vitorioso chega da terrível viagem com o objectivo ganho:
Exultai, ó praias, e tocai, ó sinos!
Mas eu com um passo desolado,
Caminho no convés onde o meu capitão jaz,
Tombado, frio, morto.

Walt Whitman, "Recordações do Presidente Lincoln" in Folhas de Erva,
Lisboa, Círculo de Leitores, 2006 (tradução de Maria de Lurdes Guimarães)

Este é, sem dúvida, o mais conhecido poema de Walt Whitman, uma comovida homenagem a Lincoln, assassinado num teatro em 14 de Abril de 1865.
Whitman (1819-1892) é o mais importante poeta norte-americano, um dos principais poetas da modernidade e, afinal, de todos os tempos e lugares. A primeira versão da seu único livro de poesia,
Leaves of Grass, considerado a Bíblia da democracia americana, foi publicada em 1855. Em Portugal, o interesse pelo poeta nasceu com Fernando Pessoa, que o considerava «seu irmão em Universo», mas só a partir dos anos 70 esse interesse entra nas nossas universidades. Nos próprios Estados Unidos, apesar da obra de Whitman ser das mais lidas e investigadas, os currículos escolares raramente a incluem, por razões de éticas.
(Cf. Manuel Frias Martins, «O canto geral da Humanidade» in Expresso de 18/04/2003)