quinta-feira, 16 de outubro de 2008

As minhas noites

As minhas noites são negras,
Negras das insónias,
Dos pensamentos arbóreos
Que se sucedem, saltitantes,
Sem atingir o final.

Negras,
Como negras são as vielas das cidades,
Onde teimam em vaguear
Seres errantes.

As minhas noites
São cor de cinza,
De um cinza desbotado e desfocado,
Como fotos velhas, e recordações...

As minhas noites
São amarelas,
Amarelas como as luzes e letreiros de néon,
Como o ouro sagrado
Das minhas ambições,
Como os pensamentos intensos e febris
Que por vezes dormem comigo no leito.

As minhas noites
São vermelhas,
Vermelhas como os desejos imensos
Encarcerados no peito,
Como o sangue que jorra, que pulsa, que corre!

Nas minhas noites algo vive
Que, à luz do dia,
Morre...

As minhas noites
São ventos
E são marés,
São flores,
São primavera.
Nas minhas noites tudo é
Eterno compasso de espera...

As minhas noites
São risos,
São choros,
Num tempo por desvendar,
São ciclones, turbilhões,
Mistérios por decifrar!

As minhas noites
São sede,
Constante,
Por satisfazer.
E há nelas uma vaga ideia,
Silhueta de mulher...

As minhas noites são lentas,
Absurdas,
Vazias,
Frias,
Até que o sono vier...!

Pensamento enevoado
Que depois se fecha a trancas,
As minhas noites, horas longas,
E nelas as angústias tantas!

As minhas noites são negras...
As minhas noites são brancas!

Luís Filipe Carvalho, Um Outro Olhar,

V. N. Gaia, Corpos Editora, 2003

Com um abraço muito especial para o poeta
e para o companheiro de infinitas noites de poesia,
o excelente diseur que muito aprecio.

Foto A.M.: Luís Carvalho no Púcaro's Bar